Veja a crítica do filme Ainda Estou Aqui

Ainda Estou Aqui: O dilema da dúvida na Ditadura Militar

Família, ditadura e o dilema da dúvida são os principais tópicos do filme mais comentado de 2024/2025, Ainda Estou Aqui. Dirigido por Walter Salles, é uma adaptação cinematográfica do livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva. A obra narra a história real de Eunice Paiva, mãe do autor, e sua luta após o desaparecimento de seu marido, Rubens Paiva, durante a ditadura militar brasileira. Mas, será que Ainda Estou Aqui vale o hype? Vamos descobrir:

Leia também- Globo de Ouro 2025: Fernanda Torres é a Melhor Atriz em Drama

A Direção que eleva a atuação de Fernanda Torres:

Veja também a crítica do filme Ainda Estou Aqui

O filme apresenta uma narrativa intimista, focando na experiência de Eunice, interpretada magistralmente por Fernanda Torres. Salles evita o sensacionalismo, optando por uma abordagem sóbria que enfatiza a resiliência e a força da protagonista diante da adversidade. Com um técnica impecável, favorecida pela excelente fotografia de Adrian Tejido, que pula da câmera na mão para planos estáticos perfeitos com luz e sombra dividindo o ambiente, e pela belíssima trilha sonora de Warren Ellis.

A direção habilidosa permite que o público se conecte profundamente com a dor e a luta de Eunice, sem recorrer a recursos dramáticos excessivos. Aliás, Fernanda Torres entrega uma performance excepcional, capturando a complexidade emocional de Eunice. Sua interpretação transmite a dor, a determinação e a vulnerabilidade da personagem, tornando-a uma das atuações mais notáveis do ano.

Aspectos Técnicos que contam mais da história:

Ainda Estou Aqui é o primeiro filme de Walter Salles no Brasil em mais de 15 anos. Não é uma história contada por alguém que não conhece o que está acontecendo na tela. A mistura das cenas com imagens de filmagens com uma Super 8 mostram isso. Pois são imagens de quem conhece os cantos da cidade e seus hábitos, mas isso nunca torna o filme exclusivo para ser contado no Brasil, ou no Rio de Janeiro.

A cinematografia é cuidadosa, com enquadramentos que refletem a tensão e a intimidade da história. Os movimentos de câmera sutis e a iluminação sombria contribuem para a atmosfera melancólica e reflexiva do filme. A trilha sonora, composta por músicas da época, complementa a ambientação histórica e emocional.

Não perca o lançamento do filme Ainda Estou Aqui

O dilema da dúvida:

De fato, Ainda Estou Aqui aborda temas universais como a perda, a resistência e a busca por justiça, situando-os no contexto específico da ditadura militar brasileira. Salles opta por não se aprofundar em explicações históricas detalhadas sobre o contexto político, preferindo focar na experiência íntima da família. Não por acaso, a obra se beneficia do conhecimento prévio do espectador, que complementa o que está sendo mostrado em tela.

Mas, tão terrível quanto a violência física é a consequência para as famílias e a obra se aprofunda na crueldade de precisar continuar vivendo sem saber o que aconteceu. Sem direito à certeza alguma, Eunice e os filhos passaram anos sem poder ao menos se despedir. Quando deixar de esperar pelo retorno? Qual é a hora de enterrar uma pessoa na própria memória?

Embora o caso de Rubens Paiva tenha ganhado notoriedade pública, outras dezenas de milhares de pessoas desapareceram no mesmo contexto e penso que a história contada por Marcelo e adaptada por Walter Salles não se esquece disso. Ao escolher dar apenas “vislumbres” da tortura física propriamente dita, a narrativa deixa para a mente de quem está assistindo visualizar os cenários terríveis e lidar com o embrulho da incerteza, da ideia de que não saber o que realmente houve torna ainda mais difícil a missão de seguir em frente.

Ainda Estou Aqui merece nossa atenção?!

O filme é uma obra cinematográfica necessária e impactante, que oferece uma visão profunda e humana de um capítulo doloroso da história brasileira. Com uma direção sensível, atuações memoráveis e uma narrativa envolvente, o filme é uma experiência cinematográfica que merece ser vista e refletida.

Em um período em que muitos flertam com o fascismo e com ideias de que “naquela época é que era bom”, Ainda Estou Aqui é o retrato de uma família destroçada pela “época boa” que durou mais de 25 anos. E até hoje nunca revelou toda a sua verdade. Um drama que nunca cai nas armadilhas do gênero e utiliza a força da jornada da protagonista como uma janela para o passado, focado sempre na sombra que rodeava a casa dos Paiva e ainda está observando a todos de perto – assim como os agentes da ditadura fizeram com Eunice e seus filhos.