Publicado recentemente pela Editora Seguinte, “Céu Sem Estrelas” foi escrito pela autora brasileira Iris Figueiredo, que trouxe uma uma história sensível, capaz de nos conectar com seus personagens e criar um elo entre os seus medos e dúvidas e as nossas próprias incompreensões pessoais. Com uma mensagem delicada de superação, deveria ser uma leitura obrigatória para todos que estão saindo da adolescência e enfrentando os temores da vida adulta.
Na história conhecemos Cecília e Bernardo, os dois protagonistas, que inclusive, intercala passagens de um e outro, levando o leitor a acompanhar os medos e o nascimento de uma linda relação, baseada na confiança e na cumplicidade. Quando Cecília completa 18 anos não há nada de conto de fadas: ela perde o emprego, briga com a mãe e é expulsa de casa. Ao passar uns dias na casa de uma amiga, ela se aproxima de Bernardo, o irmão de Iasmin, ambos se aproximam e começam um relacionamento. No entanto, Bernardo também não vive seu mar de rosas e vai precisar enfrentar as dificuldades construídas com relacionamentos frustrados anteriores. Cecília, por sua vez, mergulha a cada dia numa espiral depressiva com tantos acontecimentos, não aceita o seu próprio corpo e vai precisar enfrentar todas essas barreiras para poder seguir em frente.
Gordofobia, baixa autoestima, saúde mental e família, são temas que afetam várias pessoas na sociedade atual e que tornaram essa leitura tão emocionante pela forma como a autora os abordou. Apesar de retratar de maneira leve, colocando os personagens em situações até engraçadas, a narrativa tem uma carga bem densa e profunda. A adolescência e início da idade adulta, com todas as suas pressões e ansiedades, é uma época na qual ficamos suscetíveis a esses problemas, sobre os quais ainda impera a falta de compreensão (e empatia).
Nesse sentido, a obra retrata a questão de um modo difícil, mas também é muito sensível e realista. Há uma série de pontos de tensão na vida de Cecília. Ela tem problemas de autoestima devido ao fato de ser gorda, e sofre um enorme medo de abandono, pois o pai deixou a família e sente que a mãe não gosta de tê-la por perto. Nesse cenário complicado, em que a mãe demonstra negligência e imaturidade e ainda fica do lado do padrasto de em vez de apoiar a filha, só a avó é uma força com a qual ela pode contar. Acrescente a isso a tia chata dos almoços de domingo com comentários gordofóbicos.
“Eu era grande e gorda, então as pessoas me chamavam de fortinha. Eu não me sentia forte. Demorei muito tempo até encontrar minha própria força.”
A narrativa é feita em primeira pessoa, com capítulos de Cecília e Bernardo intercalados. Isso não só é uma escolha bacana porque nos dá uma visão do relacionamento de ambos os lados e nos deixa ver como a comunicação às vezes é falha, mas também, mais para o final do livro, cria uma enorme tensão. Enquanto os capítulos de Cecília são mais intensos, Bernardo aponta sobre suas amizades, e a falta de comunicação mais profunda entre garotos e homens, de forma geral. Ele também tem problemas com a família, e esses problemas não são desprezados só porque os de Cecília são mais evidentes.
O romance entre os dois protagonistas é muito bonito. Há troca de livros, conversas sinceras, e afeto verdadeiro entre os dois. O casal comete erros e eles têm consequências. E, mais importante, o namoro não resolve os problemas psicológicos de Cecília, e sim, sua coragem e força para seguir em frente. Por fim, vale destacar as amizades da protagonista, garotas que povoam sua vida e lhe dão força, e cujos dilemas pessoais tocam a trama e lhe dão uma profundidade extra. Inclusive, minha única crítica grande ao livro é o fato de uma delas estar passando por uma situação bem problemática que não chega a ser discutida abertamente porque os protagonistas estão mais focados em si mesmos, embora reconheçam que há um problema.
De toda forma,o livro é um retrato bem sensível, delicado e que trata de uma questões muito importantes durante a fase da vida adulta, no qual é muitíssimo importante para todas as pessoas que me trouxe muitas lições. Quem sofre dessas doenças com certeza vai se identificar com a história de Cecília, e para todos os outros é um belo exercício de empatia.