Entrevista: Uma solteirona alemã por conveniência- Cinthia Serejo comenta sobre sua obra

Trazer uma narrativa única não é fácil, por isso, Cinthia Serejo comenta sobre sua obra Uma solteirona alemã por conveniência. Afinal, ela trouxe uma protagonista marcante com sua determinação e coragem Nesta entrevista exclusiva, conversamos com a autora sobre a criação dessa narrativa e sobre uma personagem tão mágica. Dessa forma, confira mais sobre a entrevista com Cinthia Serejo:
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A protagonista do livro é decidida, corajosa e está disposta a conquistar os seus objetivos. De onde surgiu a inspiração para a criação de Emma Weber?
A Emma surgiu quase que por acaso. No início, ela era apenas uma personagem tímida do conto, nunca publicado, que deu origem à trilogia Os Flemmings. No entanto, já durante a escrita do primeiro volume, fui percebendo que havia algo especial nela, como se fosse uma força silenciosa e uma firmeza discreta, que para a minha surpresa ganhou os corações das leitoras do primeiro livro, que passaram a ansiar pelo livro dela.
Dito isso, volto para responder a sua pergunta: de onde surgiu a inspiração para a criação da Emma Weber?
Acredito que no fundo, sem perceber, criei uma personagem inspirada em mim mesma. Digo isso não no sentido clichê “Ah, eu me inspirei em mim mesma porque também sou forte, determinada e corajosa“, mas sim, naquela parte de nós que ninguém percebe. Porque a Emma tem força sim, só que é uma força contida. Ela não é uma personagem de discursos emocionantes e nem de grandes demonstrações diante dos outros. Emma sente muito mais do que fala — e eu sou muito assim como ela.
Sabe, às vezes, o que não dizemos é o que mais nos impulsiona a seguir.
A protagonista é uma mulher que desafia convenções. Você acredita que ainda hoje o status de “solteirona” carrega um estigma?
É verdade que a Emma desafia as convenções, mas ela faz isso do jeito discreto dela. Sem levantar bandeiras e muito menos tentar mudar o mundo com discursos, pois o que ela quer, no fundo, é viver o seu próprio sonho, criando quase que um mundo paralelo onde ela pode se refugiar. Esse lugar escolhido por ela foi a literatura. Ela acredita, assim como eu, que as palavras são as chaves que abrem as janelas da liberdade.
Quanto ao estigma de “solteirona”, ele continua entre nós. Talvez com uma nova roupagem, mas continua tendo a mesma força disfarçada.
Hoje, apesar de já termos conquistado alguns direitos — como poder administrar nossa própria conta bancária —, a mulher que não está casada, assim como no passado, ainda é vista como alguém que não teve sucesso na vida. É como se nós, mulheres, precisássemos cumprir um roteiro específico para podermos ser aceitas.
Que mensagem você gostaria que as leitoras levassem da jornada da personagem?
Acredito que a história da Emma carrega muitas mensagens, mas duas delas me tocam de forma especial: a perseverança e a resiliência.
Gostaria que minhas leitoras levassem consigo a certeza de que todas nós carregamos dores, mas o que nós fazemos com elas é que vai fazer toda a diferença.
Nesse livro, tanto Emma quanto Max, seu par romântico, passaram por experiências traumáticas no passado — ambas ligadas aos livros. Mas enquanto um usou isso como abrigo e força, o outro transformou em rigidez e afastamento. Por fim, ao meu ver, a moral da história aqui seria: a dor não é o fim.
A narrativa traz reflexões sobre autonomia, escolhas e liberdade feminina. Como você vê o papel da literatura nesses debates?
Assim como a Emma, acredito que a literatura é um caminho de liberdade. Ela nos dá asas. Nos leva para fora ao mesmo tempo que mergulhamos para dentro.
Lembro bem que, no período da minha adolescência, minha mãe chegou a me proibir de ler os antigos romances de bancas: Julia, Sabrina e Bianca. Talvez por reconhecer em mim uma sonhadora, ela tinha medo que todos aqueles livros que eu lia me influenciassem de forma negativa e eu deixasse de viver a vida real. Mal sabia ela que aqueles livros, lidos às escondidas dentro dos livros da escola, me apresentariam o mundo e me ensinariam a voar alto.
Acredito que o que aconteceu comigo não é muito diferente do que acontece com aqueles que ousam romper as barreiras que a ignorância constrói ao redor, não apenas das mulheres, mas de todos aqueles que ainda não descobriram que aquilo que lemos é o bem que jamais nos poderá ser roubado. A literatura é como um escultor que possui em suas mãos o poder de formar o que pensamos e quem nos tornamos. Não é à toa que em muitos países ainda seja proibido a alfabetização de suas mulheres.
Se esse livro virasse filme ou série, quem você gostaria que interpretasse a protagonista?
Eu escolheria a Isabelle Drummond, pois ela tem um olhar que diz muito, mas que ainda assim guarda mistério, sem parecer sensual. Ela me transmite delicadeza e elegância, sem parecer frágil. Sua beleza é doce, mas sem carregar um ar melancólico pelas dores da vida. Acredito que ela caberia direitinho no universo da história da Emma, onde as palavras importam, mas o silêncio diz ainda mais.
Há alguma cena que foi especialmente difícil ou emocionante de escrever?
Sim. A cena do incêndio foi particularmente desafiadora. Primeiro porque envolvia ação, o que foge bastante do que estou habituada a escrever. Depois, porque foi a primeira vez que eu precisei matar um personagem, o que por si só já carrega um peso. Mas o mais difícil mesmo foi me colocar ali, em meio às chamas, sentindo o calor, o desespero, revivendo com a personagem todos os traumas e dores que ela já carregava.
De onde surgiu o desejo de se tornar autora? Houve algum autor ou livro que despertou essa vontade em você?
Eu fui encontrada pela escrita meio que por acaso, enquanto procurava alguém que pudesse escrever um livreto infantil que pudesse acompanhar as bonecas de pano que eu fazia e sonhava — e ainda sonho — um dia levar para crianças em extrema pobreza e que jamais tiveram uma boneca na vida. Só que, ao começar estudar como se escrevia um livro, descobri o que havia buscado a vida inteira: um propósito maior que eu mesma.
Lamento dizer que não houve uma autora em especial, mas sem dúvidas devo muito aos meus companheiros inseparáveis do passado: os livros de banca.
Você tem vontade de escrever outros gêneros literários no futuro?
Com certeza! Embora meu coração pertença aos romances de época, os meus primeiros livros — “Se eu apenas O tocar” e “Lailie – a condenação” — são duas ficções bíblicas, ou seja, livros que se passam nos tempos bíblicos e que falam da fé de forma mais explícita, algo que não acontece nos meus romances de época.
Hoje, confesso que eu já estou trabalhando em um projeto que flerta com a fantasia histórica e até um realismo mágico. Eu estou muito animada com isso.
Agora se você me perguntasse quais histórias eu gostaria de ter escrito, eu responderia sem pensar: Tudo por uma Esmeralda, a Joia do Nilo e Enola Holmes.
Quem sabe um dia eu não escreva algo assim?
Existe algum livro que você sempre recomenda para todo mundo?
Além dos meus? Brincadeirinha kkk
São tantos que é difícil escolher só um, mas li recentemente um romance de época que me deixou impressionada e eu gostaria de indicá-lo para vocês: “Edenbrook” da autora Julianne