Continuando na temporada do Oscar 2025, Sean Baker, conhecido por obras como Projeto Flórida e Tangerine, retorna com Anora. Dessa vez, com um filme que não apenas expande seu repertório de histórias humanas intimistas, mas também eleva o padrão do cinema independente. Portanto, vamos falar de Anora:
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Da comédia ao drama:
À primeira vista, não é absurdo classificar Anora como uma comédia romântica, já que os elementos típicos das comédias de casais que se apaixonam e vivem um romance inesperado estão ali. No entanto, o conto de fadas idealista, que serve de pano de fundo da grande maioria das fitas do gênero, vai se revelando às avessas ao fugir dos clichês e ir abraçando cada vez mais o caos em uma trama imprevisível.
Na história, Anora (Mikey Madison — ou Ani, como ela gosta de ser chamada — é uma profissional do sexo, que parece ter finalmente se dado bem na vida ao cruzar seu caminho com o do jovem Ivan (Mark Eydelshteyn), filho irresponsável de uma família russa bilionária.
Ele se fascina por Ani a ponto de requerir exclusividade sobre ela e o que começa como uma aventura despretensiosa regada a dinheiro, drogas e muito sexo, logo se transforma em uma alucinada e dramática comédia de erros, que não abandona o afeto pela personagem de Mikey Madison.
A realidade em conflito com as escolhas:
Adotando esse tom de comédia em diversas situações, Sean Baker apela até para a fisicalidade, com sequências de lutas, fugas e embates entre os personagens, demonstrando um esforço coletivo pela intensidade das atitudes e ações tomadas por eles em diversos momentos. Até um gesto mais discreto, como sair de fininho de um batismo, torna-se escancaradamente infame e hilário pela forma absurda com que o personagem reage.
Quando adota tons mais dramáticos, é como se o diretor projetasse uma espécie de neorrealismo contemporâneo neste mundo de estética neon. Ou melhor, ele realiza um exercício às avessas do neorrealismo italiano, movimento conhecido por sua característica de abordar mazelas sociais da classe trabalhadora a partir de uma linguagem simples, emotiva e direta, enquadrando Anora como um neorrealismo norte-americano, que tem no sonho americano o seu mote principal.
Personagens que se completam com a protagonista:
Ani e todos esses outros personagens, se fossem reais — e poderiam muito bem sê-los! — seriam estigmatizados não só pela sociedade, como geralmente são pelo próprio cinema, mas em Anora, pelas lentes de Sean Baker, Ani se apresenta sem julgamentos, sem condenação e sem glamourização de sua vida.
Viramos testemunhas de uma desordem que pode causar ansiedade — remetendo ao Joias Brutas (2019) dos irmãos Safdie —, mas que nos tira riso, desconforto e talvez até choro, pois Ani é uma personagem construída a partir de atitudes humanas e Baker dá a ela o seu momento de catarse para nos revelar isso.
Vale a pena assistir Anora?
Anora é mais uma prova de que Sean Baker é um dos cineastas mais importantes do cinema contemporâneo. Ele não apenas capta a essência da condição humana, mas também nos desafia a olhar para os outros – e para nós mesmos – com mais empatia. Com atuações brilhantes, uma direção impecável e uma história que ressoa profundamente, Anora aborda perspectivas e consequências.