Diante de todas as expectativas criadas, Titãs, a primeira série original do serviço DC Universe, lançada pela Netflix no Brasil, conclui sua primeira temporada com um saldo positivo, mesmo que ainda tenha um longo caminho para percorrer no concorrido cenário televisivo. Quando as primeiras imagens e o teaser oficial foram lançados, se iniciou com uma certa descrença por parte do público, devido a caracterização dos personagens e o tom que decidiram optar. Porém, logo no primeiro episódio, é apresentado uma abordagem equivocada, introduzindo seus protagonistas com impactos irregulares, e estabelecendo um tom sombrio para a série que é gratuitamente excessivo.
Conforme os episódios avançavam, no entanto, ficou clara, a intenção da série de tratar a violência não apenas como um artifício apelativo ao público, mas como um tema narrativo para a trajetória de seus personagens, principalmente Robin, e sua jornada de auto descobrimento. O destaque dado a Dick Grayson (Brenton Thwaites) também evidencia o quanto Titãs precisa repensar sua estrutura narrativa, e a maneira como equilibra seus personagens principais.
A trama em si é focada no relacionamento entre Dick e Rachel (Teagan Croft) — também conhecidos como Robin e Ravena. Ele está fugindo do seu passado em Gotham City. Já a jovem possui um poder que não consegue compreender, sendo caçada por organizações misteriosas. A ideia não é ruim. Afinal, ambos precisam lidar com a escuridão dentro de si e constroem um laço que questiona o significado de família. O problema é que os outros membros importantes do grupo de heróis são esquecidos, mesmo tendo grande potencial. Kory/Estelar (Anna Diop) ainda ganha alguns momentos de destaque, mas Gar/Mutano (Ryan Potter) é praticamente um coadjuvante de luxo.
Pensando na narrativa em si, o foco na mitologia de Ravena é acertada, já que a origem mágica da personagem é responsável por um dos melhores arcos dos Titãs. Por sua vez, a execução não é tão acertada. A escolha de apresentar uma Ravena inexperiente é ousada, funcionando bastante no início da temporada. Só que a enrolação para dar explicações ao público e a constante inocência de Rachel irrita o espectador e prende o desenvolvimento da história.
Mas o grande problema da série reside nos ombros do ex-Robin, que tem uma boa interpretação, mas os olhos só ficam presos nele. Ou melhor, é clara a intenção dos produtores de tentar explorar a figura do Batman o máximo de tempo possível, a fim de agradar os fãs, mesmo sem escalar um ator para viver Bruce Wayne, a fim de não atrapalhar qualquer rumo que o Homem-Morcego tenha nas telonas com o Universo Estendido DC. Ao invés de conhecer mais sobre Kory e Gar, o público fica preso numa série de flashbacks desnecessários, que não acrescentam muito para a narrativa.
Isso sem falar que todos os personagens relacionados ao universo de Dick Grayson são mais interessantes que o próprio vigilante/detetive. Hank (Alan Ritchson) e Dawn (Minka Kelly) são apresentados logo no início, mas só ganham profundidade na reta final, quando ganham um episódio solo que somente existe para aumentar o suspense de um cliffhanger envolvendo Kory. E, mesmo assim, o capítulo da dupla surpreende. Chegando quase aos 45 minutos do segundo tempo, Donna Troy (Conor Leslie) é pura simpatia, elegância e empoderamento; deixando o espectador na torcida por mais cenas dela. Até a breve participação do novo Robin, Jason Todd (Curran Walters) traz algo novo para a mesa. Dentre tantos heróis interessantes, Grayson fica bem ofuscado e parece só ganhar importância por ser o Robin!
Outro grande defeito da trama está presente na falta de ritmo. Parece que a ordem dos episódios foi escolhida num sorteio, onde a narrativa central vive sendo cortada para inserir novos personagens ou fazer curvas desnecessárias. Após o já citado arco de Rapina e Columba, o mistério de Kory só é esclarecido no penúltimo capítulo. A origem de Gar é contada em apenas uma cena, enquanto o resto de “seu episódio” só serve para dar um pontapé no spin-off de Patrulha do Destino. Assim, o que prometia ser uma aventura bacana se perde com exageros de fan service e ferramentas antiquadas para manter a atenção do público.
Agora, chegou o momento de falar o que deixou todo mundo curioso e preocupante com o conteúdo: a restrição etária. Realmente, a série não compartilha o clima feliz do ‘Arrowverse’, se aproximando mais de Gotham nesse sentido. A proibição para menores de idade permite incríveis e brutais sequências de ação, além de alguns palavrões aleatórios, mas não é muito utilizada em cenas de sexo, curiosamente. O resultado culmina num novo e interessante estilo para o gênero de heróis na TV.
Sobre o elenco em si, Brenton Thwaites se esforça para carregar a trama, mas é Anna Diop quem rouba todas as cenas. Ela constrói uma Estelar divertida, hipnotizante e poderosa, ainda mais gratificante ao lembrarmos como a jovem atriz foi vítima de comentários racistas ao ser escalada como a heroína, mas acabou se tornando a melhor personagem da atração. Croft fica presa numa personagem que não evolui, enquanto Potter traz bom alívio cômico no pouco tempo que possui em tela. Dentre coadjuvantes, fica a aqui a torcida para Conor Leslie ser promovida ao elenco regular, pois deu até vontade de ver um spin-off sobre Donna Troy.
Infelizmente, a temporada termina com um episódio bem fraco e completamente aleatório que poderia ser descartado facilmente, mas o que resta é esperar o segundo ano. Por fim, Titãs é uma série divertida, mesmo recheada de problemas. Traz algo diferente para um público cercado por tantas histórias do gênero, mas faltou mais do que realmente significa ser um Titã.